Por que a participação ativa dos povos indígenas é fundamental nas negociações da COP28?

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indigenous people gather together and raise fist to sky
The impact of global warming is felt strongly in Brazil, and Indigenous, riverside and working class urban communities are the ones that suffer most. Matheus Alves / Sumauma

Esta semana, a plataforma de jornalismo Sumaúma, que adota o enfoque "forest first" (florestas em primeiro lugar), está indo de Altamira, no Brasil, para a COP28, em Dubai. Sua repórter Claudia Antunes explica o motivo

Sumaúma, ou kapok, como é conhecida em inglês, é o nome de uma das árvores mais altas da floresta amazônica. Com um tronco largo e raízes sólidas e espalhadas, a sumaúma vive por cerca de 300 anos e está presente na cosmologia de muitos povos indígenas brasileiros, como os Xipaya, que a consideram um elo entre o céu e a terra. 

Pegamos emprestado o nome Sumaúma para nossa plataforma de jornalismo, sediada em Altamira, no estado amazônico do Pará. A área urbana de Altamira é cercada por territórios de comunidades indígenas e tradicionais, que são alvo de madeireiros, garimpeiros ilegais e grileiros que visam ampliar as fronteiras para a soja e a criação de gado.

A cidade faz parte do chamado "arco de desmatamento” – a linha de frente da destruição. Entre 1985 e 2021, a Amazônia brasileira perdeu 12% de sua cobertura florestal devido à atividade humana predatória.

smoke from forest fire in amazon rainforest, which is suffering deforestation

Cientistas apontaram que o clima extremo no Brasil está ligado à destruição da floresta tropical por madeireiros, fazendeiros e mineradores. Lela Beltrão/Sumaúma

Nós da Sumaúma consideramos a Amazônia o centro do mundo. Isso não se deve apenas ao fato de a maior floresta tropical do mundo ser um sumidouro  global de carbono e um regulador regional de chuvas. Acreditamos também que as comunidades da floresta, que vivem em simbiose com a natureza, podem ser um guia para a transformação sistêmica de que toda a humanidade precisa urgentemente para enfrentar a crise climática que ameaça as gerações atuais e futuras. 

As negociações sobre o clima devem ser inclusivas para haver uma possibilidade de alcançar a justiça climática. É importante que a Sumaúma esteja presente na Cúpula do Clima das Nações Unidas deste ano, a COP28, para amplificar as vozes dos povos indígenas e das comunidades tradicionais da floresta, de modo que essas vozes sejam ouvidas acima daquelas dos lobistas de grandes poluidores que, infelizmente, dominam o espaço das negociações. 

O impacto do aquecimento global está sendo sentido com força no Brasil neste ano e, como sempre, as comunidades indígenas, ribeirinhas e das periferias urbanas são as que mais sofrem. Passamos porr inundações atípicas no sul do país, uma onda de calor no Sudeste e uma seca extrema no Norte, onde fica a floresta amazônica. Juntamente com o El Niño e a mudança climática global, os cientistas apontam que esses eventos extremos também são  influenciados por fatores locais, como a destruição da floresta tropical por madeireiros, fazendeiros e mineradores

indigenous peoples' representative's silhouette in setting sun

Este ano, os representantes dos Povos Indígenas irão à COP para exigir justiça climática, o fim do racismo ambiental e insistir que devem fazer parte da solução. Matheus Alves / Sumaúma

Com a seca na Amazônia, rios caudalosos como o Negro chegaram a  seus níveis mais baixos em décadas, e as aldeias que dependiam deles para pesca e transporte ficaram isoladas. O ar de cidades como Altamira e Manaus, capital do estado do Amazonas, foi afetado durante semanas pela fumaça de incêndios que se espalharam facilmente, já que a floresta está extremamente seca. 

O atual governo, liderado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, conseguiu diminuir os altos níveis de desmatamento que foram a marca registrada da administração anterior de Jair Bolsonaro, um negacionista do clima. Mas as áreas que foram desmatadas estão mais frágeis e inflamáveis, e os níveis de perda de floresta continuam perigosamente altos

A COP28, realizada em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos – um Estado petrolífero – ganhou maior urgência devido à intensificação de eventos climáticos extremos. 

Para o Brasil, um resultado sólido é vital, já que o país deverá sediar a COP30 em 2025, quando o Acordo de Paris completará 10 anos. A COP30 será realizada em Belém, capital do Pará, e nela os países-estados-membros terão que apresentar metas mais ambiciosas para atingir o objetivo mundial de reduzir drasticamente os gases de efeito estufa. 

Desde a reunião de cúpula dos oito países da região amazônica na mesma cidade, em agosto de 2023, os movimentos sociais têm pressionado as autoridades brasileiras a resolver as contradições internas do país. O Brasil prometeu acabar com o desmatamento até 2030, mas o Congresso está discutindo projetos que dificultarão a proteção e a demarcação das terras indígenas, onde a floresta é mais bem preservada. O governo Lula tem afirmado que quer transformar o país em uma "potência verde", mas manteve os planos de abrir novos campos de exploração de petróleo e gás, inclusive na Amazônia.

Os movimentos que organizaram as manifestações em Belém em agosto – representando povos Indígenas, trabalhadores rurais sem-terra, comunidades Ribeirinhas e Quilombolas, os descendentes de africanos escravizados – enviarão representantes a Dubai. Mais uma vez, eles terão que romper barreiras de classe, cor, gênero e idioma – muitos deles são pelo menos bilíngues, mas nenhum de seus idiomas, indígena ou português, é oficial na ONU. Eles exigirão justiça climática, o fim do racismo ambiental e insistirão que devem fazer parte da solução.

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